01/05/2019 12:05

São José Operário

São José de tantos títulos, cuja existência deu-se para exaltar e proteger, amar e nutrir sua esposa Maria Santíssima e seu Filho Jesus. Homem trabalhador, provedor e cooperador no cumprimento da vontade de Deus não apenas em sua vida de vocacionado à paternidade, mas sua vocação protegeu e garantiu a vocação de Maria, e sua missão de pai trabalhador permitiu que Jesus seu filho crescesse em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens. Mesmo que Maria e Jesus dependeram dele por algum tempo, seu nome geralmente será lembrando em dependência dos nomes da Esposa e do Filho. Por isso, o presente texto visa de modo sucinto apresentá-lo como o homem do silêncio e do labor constante.


A Solenidade de São José Operário nos coloca em atencioso estado de aprendizado, pois temos neste paradigma de homem que ultrapassa os séculos não apenas um modelo a ser seguido, e sim várias inspirações num só modelo. Deste modo não é possível falar apenas em José como patrono dos trabalhadores, mas como modelo dos pais de família, espelho de paciência, gloria da vida doméstica, consolação dos infelizes, patrono dos moribundos, protetor da Santa Igreja, e tantas outras invocações, das quais uma ladainha seria insuficiente para descrever tantas virtudes que se acerca a tão grande personagem.


São José destacou-se como operário pela profissão que exerceu durante sua vida. Para muitos estudiosos dos ‘evangelhos da infância’, Jesus cresceu em meio aos trabalhos de carpintaria exercidos pelo seu pai nutrício, chegando a herdar dele o mesmo oficio; fato que nos é descrito no Evangelho Segundo São Mateus, em que Jesus conta um conjunto de sete parábolas a seus discípulos e a todo o povo que o escutava, atraindo assim a admiração e a desconfiança por parte de seus conterrâneos: ‘De onde retira seu saber e seus milagres? Não é este o filho do carpinteiro?”. É comum notar nas imagens que ilustram o título de nosso estimado santo operário, o Menino Jesus a seu lado na carpintaria, ou em seu colo, com instrumentos típicos deste oficio, e até mesmo sozinho tendo a carpintaria ilustrando o ambiente em que se encontra. Notamos que o fato de ser Filho do humilde artesão levará aos corações de seus conterrâneos questionamentos repletos de descrédito acerca de seu ministério.
José fora tão discreto que dele só sabemos que era carpinteiro. Toda a sua vida distante dos protagonismos tão almejados em meio aos homens deu-se em relação à Maria sua Esposa e Jesus seu filho. Neste sentido São José destaca-se como modelo no serviço a Deus e às coisas que dizem respeito ao mundo, mostrando que é possível ser protagonista sem com isto viver para perseguir o protagonismo. Quando falamos sobre ele já nos vem à memória a imagem de sua Esposa e de seu Filho.
No mundo marcado pela difusão e cultivo do que se considera mérito, São José destoa da mentalidade atual, marcada pela competição que nos leva a tornar o outro invisível à nós; ao contrário, mostra-se o homem da alteridade – conceito atual, mas que revela uma característica presente em nosso querido santo – viveu para fazer viver seu Filho quando teve que fugir para o Egito (Mt 2,13), e antes disso sua Esposa, quando decidiu deixá-la em segredo não tendo a intenção de difamá-la (Mt 1,20). Mostra-nos que o serviço de tornar outros protagonistas é agradável a Deus, e para servir a Deus nem sempre teremos de falar, mas o nosso calar e agir serão para que outros se destaquem.


O Papa Francisco em 1º de maio de 2013 faz referência a dignidade do trabalho humano a partir da figura de São José e do próprio Jesus que se encarnou em nosso meio. Afirma o papa: “Jesus entra em nossa história, está entre nós, nascido de Maria pelo poder de Deus, mas com a presença de São José, o pai legal, de direito, cuida dele e também lhe ensina seu trabalho.[...]na carpintaria em Nazaré, dividindo com ele seus compromissos, esforços, satisfação e dificuldades do dia a dia”. No mesmo caminho um século antes, dizia Leão XIII na Quamquam pluries (Sobre o lugar de São José na ordem da salvação): “desta dignidade pro fluíam espontaneamente os deveres que a natureza prescreve aos pais de família, de modo que José, sendo chefe da família divina, era também seu custódio, administrador defensor natural e legítimo. E tais deveres e encargos, com efeito os cumpriu no decurso de sua vida mortal....”. Assim, retornemos ao Papa Francisco que afirma ser o trabalho parte do plano do amor de Deus, e por isso somos chamados a cuidar de todos os bens da criação, participando ativa e responsavelmente da obra criadora. O Ofício exercido por São José como dito acima, e transmitido a Jesus, nos mostra que o homem exerce sua missão de ‘ser humano’ quando é plenificado pela graça do labor diário, tornando-se cada vez mais semelhante ao Criador que trabalha sempre, como vemos em (Jo 5,17): “Meu Pai até agora trabalha, e eu também trabalho”.
Tendo em vista a temática do trabalho, como não olhar para as grandes dificuldades dos filhos de Deus espalhados nos vários países do mundo, que não gozam da graça de ter um modo de colher o fruto com o suor de seu rosto? Esta triste chaga que toca o coração da humanidade afeta sobretudo os mais pobres, que são as maiores vítimas do que o papa Francisco chama de concepção econômica mecanicista; tal visão deixa os valores da justiça social, lançando-se na busca desenfreada de um lucro que desumaniza e desfigura os filhos de Deus.


O pai Providente de Jesus olha mais para outrem do que para sí, dentro da dinâmica do trabalho, o que percebemos é o incentivo à competição, e o mercado fecha cada vez mais os homens numa bolha que os leva a separar-se dos demais semelhantes por causa do próprio lucro. A justa distribuição de trabalho e de riquezas geradas como consequência, devem estar ao alcance de todos afirma Pio XI na Quadragesimo anno’ ao parafrasear Leão XIII: “As riquezas que constantemente aumentam pelo desenvolvimento socioeconômico, devem ser distribuídas entre os indivíduos[...] Esta lei de justiça social proíbe que uma classe exclua a outra na participação dos benefícios”. Como São José Operário, os trabalhadores e empregadores devem lançar um olhar abrangente sobre a sociedade, sentindo-se cada vez mais responsáveis e cuidadores da mesma. E continua Pio XI: “assim também no trabalho contratado compreende-se, evidentemente, que deve ser considerado não somente seu caráter pessoal, mas social”. Ao que acrescenta: “se nenhuma ordem social e jurídica protege o exercício do trabalho [...] e se o capital e o trabalho não se unem na mesma direção, a atividade dos homens não pode produzir seus frutos”.


Na homilia do papa Francisco, o pontífice se solidariza e lança um apelo aos chefes do setor público: “Gostaria de convidá-los ao encorajamento, a fazer de tudo para dar novo impulso ao emprego, isso significa se preocupar com a dignidade da pessoa mas, acima de tudo, vos exorto a não perderem a esperança”. São José de igual modo, teve que cultivar em si a esperança diante de tantas vicissitudes; sua capacidade de escuta a Deus o permitia manter viva em seu coração a esperança de dias melhores. Esta mesma esperança que sustentou São José, é a mesma que mantém firmes tantos pais e mães, tantos jovens e pessoas de idade avançada, a encarar o dado do desemprego que atinge nosso Brasil com dignidade. Tantos são como José! Sejam os imigrantes que adentram o país em busca de melhores condições de vida, sejam nossos próprios compatriotas, que se lançam em “aventuras” por vezes perigosas para buscar o sustento tão necessário aos seus familiares.


O silencioso São José


Como devotos deste Patriarca, devemos guardar em nosso coração a certeza de que Deus nos proverá tudo; e que de igual modo temos de realizar a nossa parte para que esta providência se torne concreta em nossas vidas. Por isso o compromisso de pais, mães, jovens, e operários de todas as idades, deve crescer sempre por intermédio deste precioso patrono, para que as dificuldades da vida não os lancem num equivocado medo do futuro, mas que mantenham vivas as suas esperanças que não os levarão ao engano, como nos afirma o Apostolo Paulo em (Rm 5,5).


Não poderíamos deixar de mencionar o silencio de José nos ofícios cotidianos, que reflete o silêncio de muitos trabalhadores em nossos dias. Para ouvir a Deus, mesmo na ação de nossas atividades diárias é preciso silenciar-se antes na contemplação; e não há exemplo maior que o do operário silencioso. Tudo o que podemos dizer sobre o Carpinteiro de Nazaré é digno e merecedor de sua parte havendo, necessidade de acrescentar-se a todos os seus possíveis adjetivos o que melhor lhe define: o silêncio! Tal caraterística mostra-se imprescindível nos dias atuais, uma vez que o homem moderno é abatido por uma necessidade de barulho constante, onde mesmo quando não profere palavra alguma usando o recurso da fala, suas mãos agem freneticamente a digitar em seus celulares, tablets ou computadores; isto quando as imagens enviadas ou recebidas por estes meios geram reações, que mesmo no silêncio da fala gritam no interior dos corações dos mais variados modos. Deste modo podemos dizer que o silêncio de José é um brado profético que nos indica a urgência do que os homens e mulheres de nosso tempo realmente necessitam; ou seja, lutar contra os ruídos constantes que os fazem não compreenderem a sua missão.


Na figura do pai adotivo de Jesus, percebemos que o verdadeiro silencio é aquele que não se faz pela falta das palavras, é aquele que se faz pelas obras praticadas. José operário silencioso nos indica que por esta via é possível alcançar todas os nossos sonhos, em sintonia como os sonhos de Deus para conosco.


Assim sendo, o nosso ‘ser operário’ no significado literal da palavra ganha todo sentido, quando na dinâmica de nossa vida cotidiana somos capazes de provar deste traço marcante na vida do operário de Nazaré. Podemos nos encontrar em silêncio em nosso caminho para o trabalho, em meio as falas e agitações dos ônibus e metrôs lotados; permitindo que no ordinário de nossas vidas façamos a experiência de perceber como José o projeto de Deus para nossas vidas através do recolhimento durante nosso trajeto. É nos desviando dos ruídos produzidos por tantos meios, que podemos distinguir a vontade de Deus em nossas vidas por meio de cada jornada diária, em que temos de enfrentar dificuldades diversas, seja no caminho, seja no exercício do ofício ao qual somos encarregados. Tendo José como espelho podemos agir segundo a vontade de Deus e a dignidade do homem, que necessita trabalhar para prover o necessário em sua.


Que São José Operário nos inspire sempre.


São José Operário, Rogai por nós.